NUNCA
CHORE POR MIM
Música
de Santanna, o Cantador & Luiz Alberto Machado
Nunca chore por mim
Não chore não
Que um dia eu volto
Pra te buscar
A partida e o caminho
Nas minhas mãos
E olhos da vida
A me vigiar
Eu percebo o destino sob os meus pés
E a saudade no peito agourando a solidão
O exílio e o aceno na estação
Incidem na voz um lamento de adeus
De quem vai se entregar
Seja em qualquer lugar
Onde a sorte vier
É seguir cada qual a sina de agora
Desatino vadio da ilusão
O apito do trem apressa a hora
Marcando o compasso do meu coração
Cada rosto se expõe na dor que chora
Quando o sonho é varrido pela paixão
Já é tarde estou indo, eu vou embora
É que o choro arrocha o nó da canção
De quem vai se entregar
Seja em qualquer lugar
Onde a sorte vier
Perdão dos amores desfeitos na tora
Arrancados no véu da contramão
Fizeram outono na minha história
Atraindo abono e a distração
Pelas ruas ganhei a pose e o disfarce
O abraço e o perigo da delação
Para a vida ofereço a outra face
E pra morte celebro a confissão
De quem vai se entregar
Seja em qualquer lugar
Onde a sorte vier.
NUNCA CHORE POR MIM – Era noite estrelada na praça da prefeitura, uma noite com data
perdida no céu de Palmares, Pernambuco.
Ali,
aboletado num banco da praça, Santanna, o Cantador solfejou uma canção. Ele
parecia iluminado e me fez testemunhar um verdadeiro ato mágico: um canto clarividente
no qual toda a minha vida se passava num caleidoscópio, uma melodia feita Aleph
na minha existência.
Saquei
o violão com o fito de acompanhar seu canto: um prelúdio que me dava a sensação
dum solilóquio comovedor. Ele soltava a voz e eu agraciado cada vez mais me
empenhando em acompanhá-lo.
À
certa hora silenciou parece que emocionado e tomado pela iniciação: vi-lhe os olhos
na imensidão. Que música linda é essa? – perguntei-lhe. Não sei, estou fazendo
agora -, respondeu. Como é?
Com
sua resposta, às pressas corri até o carro estacionado no meio fio da outra
calçada, peguei papel e gravador, e voltei imediatamente no intento de
registrar tudo.
Ao
me acomodar refeito, dedilhei no pinho com um lalarilará desajeitado, enquadrando
os acordes na sua melodia.
Repete
-, insisti. E ele voltou a cantarolar enquanto eu seguia na tentativa de
gravar, anotar e interagir na sua criação, acompanhando ao violão pelos possíveis
refrões e estribilhos.
Foi
aí que ele bradou melodiosamente: Nunca
chore por mim, não chore não, que um dia eu volto pra te buscar...
Então,
virou-se feito um oráculo com a dádiva do prêmio: - Toma -, disse-me ele – faz a
letra.
Nem
conversamos mais. Arrumei tudo no alforje, dei-lhe um abração de boa noite e
zarpei pra casa carregando a música na cabeça e no gravador, anotada em todos
os seus detalhes no caderno.
Daí,
dias e dias insones, ela parida e ubíqua transpirou nas minhas entranhas e
ideias, até virar refrigério de missão cumprida.
Avisei-lhe
e nos encontramos noutra noite: sacudi na caixa dos seus peitos o que
inicialmente se chamou de Balada de Quem Vai Embora.
Em
mim havia a expectativa de sua anuência. Ele ouviu atentamente e mandou que eu
novamente executasse o violão e começou a cantar a letra impressa no papel.
A
satisfação estampava na sua face e uma vírgula sequer de rejeição havia
emergido das suas repetidas releituras.
Novamente
virou-se com o ar da graça de quem comunga e me abraçou efusivamente: - Poeta!
Pronto,
estava instituída a minha trilha sonora pro resto da vida, nascendo uma
parceria que renderia depois mais algumas músicas.
Veio,
então, João Silva, anos depois, para o projeto de gravação do primeiro disco só
com músicas da parceria dele com Luiz Gonzaga, vez que Santanna já era famoso por
esse repertório em suas apresentações contratadas. Depois das gravações das músicas
da dupla João Silva/Luiz Gonzaga, ele me liga para eu ir até o estúdio em
Recife, passar os acordes da nossa parceria pros músicos. A festa foi grande
por reencontrar naquela ocasião o guitarrista Vavá de Aprígio, amigo meu de infância
e que não via há anos, bem como a de conhecer pessoalmente o legendário
sanfoneiro Camarão. Isso feito, já à noite, estávamos todos num restaurante
onde eu autografava o meu livro Paixão Legendária e, logo após, Santanna faria
um show. Foi uma verdadeira confraternização. E o que era uma balada de quem ia
embora virou uma toada Nunca chore por mim no disco Gonzagão, meu professor, de
1992.
Em
2001, nove anos depois da primeira gravação, ele repete a dose regravando a
nossa Nunca chore por mim no seu cd Xote pé de serra, agora com nova roupagem. Foi
exatamente quando ele me concedeu a entrevista publicada aqui no Música, Teatro & Cia.
Em
2008, a nossa música ganhou um clipe feito pela saudosa Derinha Rocha, reunindo
um vídeo com apresentação do Santanna e o áudio dele na música. Esse presente
deveu-se ao fato dela sempre me ver cantando essa música nas minhas apresentações
alternativas.
Até
que em 2011, quando da realização do meu show Crônica de amor por ela, no
projeto Palavra Mínima, da Cooperativa da Música de Alagoas (Comusa), em Maceió,
fui flagrado pela filmagem do Sidclei Gomes, interpretando a música na forma e
jeito que ela foi criada. Resultado: um presente chegou agora num clipe produzido
pela querida Meimei Correa.
Sou
feliz e grato por essa parceria. Mais ainda por ter privado da amizade do
cantador, possibilitando que cometêssemos novas parcerias que ainda se
encontram inéditas e que fazem parte do rol das canções que comporão meus
projetos musicais mais adiante. E viva Santanna, o Cantador, salve, salve.
Veja
mais Crônica de amor por ela.