sábado, maio 15, 2021

SOMBRAS DO CORAÇÃO – ROTEIRO CURTA-METRAGEM

 

 

SOMBRAS DO CORAÇÃO

ROTEIRO, DIREÇÃO & MÚSICA: LUIZ ALBERTO MACHADO

 

ABERTURA. MÚSICA. TÍTULO.

CRÉDITOS INICIAIS.

 

CENA 1

 

A porta fechada do apartamento. Ouve-se o barulho da chave na fechadura, a porta se abre de repente. Entra Gilvanícila que acende a luz, tranca a porta, se encaminha para a mesa onde deposita a bolsa, chaves, mantimentos numa sacola de supermercado. Ela está cansada de um dia estafante, retira o casaco, senta-se. Descalça a sandália, desabotoa a calça comprida, esbaforida, pega os mantimentos e vai guardar no compartimento, alimentos na geladeira, remove lacres e os joga na lixeira. Ela se abana, suspira, remexe a bolsa, retira o telefone celular, confere deslizando o dedo no aparelho, deposita-o sobre a mesa. Remexe novamente a bolsa, retira agenda e outros utensílios. Está ofegante. Segue até o banheiro, porta entreaberta, ouve-se o barulho da água do chuveiro. O telefone toca, mas ela não ouve. Solfeja uma música ao banho enquanto estridula o telefone insistentemente.

 

SOBE O BG. BLACK-OUT. OUVE-SE APENAS O TRINADO DO TELEFONE INSISTENTEMENTE.

 

CENA 2

 

Ouve-se a suspensão do barulho do chuveiro e o larilará de Gilvanícila.

 

GILVANÍCILA

 

Já vou! Eita, telefone para não me dar sossego... Já vou!

 

ABRE-SE A PORTA DO BANHEIRO, SAI GILVANÍCILA VESTIDA COM UMA BLUSA GRANDE DE ALÇAS, TOALHA ENXUGANDO O CABELO, ATENDE DESAJEITADA O TELEFONE.

 

GILVANÍLA (atendendo o telefone)

 

Alô!... Diz mulher... estava no banho. Como é? (TRANSTORNADA) Quando foi isso? (SENTA-SE, ELA ESTÁ FEIÇÕES GRAVES). Desde quando?... Sim... Diz isso não, mulher... (IMPACIENTE, ELA SE LEVANTA E FICA OUVINDO O TELEFONE ANDANDO DE UM LADO A OUTRO). Onde ela está?... sim... onde?... Onde é que fica?... Vou agora mesmo praí... Como não?... Diz isso não, mulher... (ELA COMOVIDA, COMEÇA A CHORAR) Por que?... Diz isso não... Faz isso comigo não... Faz isso não... Como é que pode?... (ELA ENTRA EM DESESPERO). Diz isso não... E como é que ela está?... Não é possível que ela tenha dito isso... Não pode ser, faz isso comigo não... (ELA SENTA-SE E COMEÇA A FALAR CHORANDO, QUASE NÃO SE DÁ PARA ENTENDER SEUS LAMENTOS E O DESABAFO. LEVANTA-SE OUVINDO O QUE A VOZ DIZ DO OUTRO LADO DO TELEFONE. RONRONA, CHORA. CAMINHA DE UM LADO A OUTRO, INCONSOLÁVEL, OUVINDO DETALHADAMENTE. SENTA-SE NOVAMENTE, CHORANDO, MÃO À CABEÇA). Quer dizer que ela não quer que eu vá praí... Faz isso comigo não... Por que?... Tá, vai me diz, por que ela não quer me ver nem quer que eu vá praí, diz... (ELA MAIS SE DESESPERA). Não pode ser... Vou me arrumar e vou praí agorinha, queira ou não... Por que ela não quer me ver, diga?... Por que?... (ELA SE DIRIJE PRO QUARTO, DEITA-SE NA CAMA, AOS PRANTOS, OUVINDO O RELATO DA VOZ QUE FALA AO TELEFONE). Diz isso não... Tá. E os médicos disseram o quê?... (ELA SE AGARRA AO TRAVESSEIRO, ESCONDE A CABEÇA OUVINDO AO TELEFONE).

 

SOBE O BG. BLACKOUT.

 

CENA 3

 

(GILVANÍCILA ABRE OS OLHOS, ESTÁ DEITADA AO TRAVESSEIRO, OLHOS INCHADOS DE CHORAR. LEVANTA-SE LENTAMENTE, SENTA-SE AO LADO DA CAMA, PENSATIVA).

 

GILVANÍCILA

 

Por que ela não quer me ver? Não pode ser... Só me faltava essa...

 

(ELA LEVANTA-SE RESMUNGANDO, FALANDO SOZINHA, PEGA UM COPO, VAI ATÉ A GELADEIRA, RETIRA GELO, COLOCA NO COPO, PEGA UMA GARRAFA DE UÍSQUE, COLOCA UMA DOSE, BEBE, ACENDE UM CIGARRO E, COM A FUMAÇA DA BAFORADA, DESABAFA SOZINHA).

 

GILVANÍCILA

 

Ela nunca gostou mesmo de mim. Sempre notei isso, mas me negar de vê-la hospitalizada, deixar claro que não quer a minha presença ali, a sua idade, pode ser a última vez, a minha oportunidade de vê-la e saber dela por que ela nunca gostou de mim, por que sempre me tratou com desprezo, sempre botou gosto ruim nas minhas coisas e vida, me encaminhou logo cedo pros meus avós, nunca quis cuidar de mim, eu cresci e vivi minha vida toda longe dela, nunca quis saber de mim, nunca gostou do que fiz ou faço, sempre me condenou, sempre disse não para mim, nunca um afeto, um carinho, não sei o que é carinho de mãe, por que, por que, por que? Por que, mãe?

 

(SENTA-SE À MESA, COLOCA AS MÃOS À CABEÇA, RESMUNGANDO. PEGA UM COPO, DIRIGE O OLHAR PERDIDO PARA ALGUM LUGAR E RUMINA ENQUANTO BEBE, ACENDE UM CIGARRO, NERVOSA).

 

GILVANÍCILA

 

Preciso descobrir. Pensa, mulher! (BEBE, TRAGA E BAFORA O CIGARRO. O TELEFONE TOCA, ATENDE DESAJEITADA). Ôi, mulher, como ela está?... Imagino... Eu vou praí... Por que não?... Não faz isso comigo, eu preciso da minha mãe, preciso estar perto dela, preciso sentir pela primeira ela perto de mim, não lembro quando ela me afagou e a afaguei, nunca tive carinho de mãe, preciso saber dela por que ela nunca gostou de mim... Eu sei que ela não gostava de mim e morria de ciúmes do meu pai comigo, eu sei... Se não era ciúmes do meu pai comigo, ele era tão carinhoso, tão atento a tudo que eu fazia, só pode ser isso... Tá, se não era ciúmes do meu pai comigo, o que era então?... Ah, você é amiga dela, conviveu com ela todo o tempo do mundo que eu nunca pude viver, ela nunca quis estar comigo, me jogou na casa dos meus avós e me abandonou para sempre... Eu sentia que ela não gostava de mim e toda vez que eu a visitava ela era indiferente, fria, distante, nunca se aproximou de mim, nunca me deu um beijo, nunca procurou por mim, bastava eu chegar e ela já dizia que era hora de ir e eu queria tanto conversar com ela, saber dela, ouvi-la contar da sua vida, dividir com ela a minha vida... Por que não?... Então você sabe a verdadeira razão... Faz isso comigo não, vai, me conta, preciso saber por que minha mãe nunca gostou de mim... Ela me odiava, parece... mas por que? Ah, tá... me liga, por favor... não me deixa aqui aflita sem saber de nada, senão eu vou praí!... Tá bom, me deixa a par, por favor, só você pode saber da minha aflição, não me abandona, me deixa a par de tudo... Tá bom, aguardo sua ligação com os resultados...

 

SOBE O BG. GILVANÍLIA BEBE, ACENDE OUTRO CIGARRO, ESTÁ NERVOSA. LEVANTA-SE FALANDO SOZINHA, VAI DE UM LADO A OUTRA DA SALA, ESTÁ INQUIETA.

 

GILVANÍLA

 

Nunca tive amor de mãe, não sei o que é isso. Meu pai, enquanto viveu, supria essa falta, sempre carinhoso, sempre atencioso, meu pai não existia, era coisa de outro mundo. Ele se foi faz tanto tempo, mas ainda o sinto aqui, ao meu lado... ah, meu pai, que falta você me faz! Esteve sempre ao meu lado, comigo o tempo inteiro, não me deixava perdida, tão vulnerável, como eu preciso do abraço dele agora... Meus avós, coitados, sempre me deram apoio, vovó foi uma mãe exemplar, substituiu a minha mãe à altura, não posso reclamar. Mas, poxa, carinho de mãe é importante e ela viva todo esse tempo me rejeitando, por quê? Por que será, meu Deus, que minha mãe não quer me ver nem pintada a ouro, nunca quis, nem mesmo agora em que ela está nesse momento de difícil, entre a vida e a morte. Não quer me ver, não quer que eu vá pro hospital, não quer sequer saber de mim, por que será, meu Deus?... (O TELEFONE TOCA, ELA ATENDE). Sim, vai, me dá notícias dela... Sim... Faz isso comigo não, vai... E os médicos disseram o quê?... Eu vou praí... eu preciso, mulher, preciso estar perto da minha mãe... faz isso comigo não... Tá bom, ficarei aqui aguardando as notícias, me deixa a par, por favor... eu só queria saber porque ela me odeia tanto... Eu sei que não é hora para isso, mas são tantas perguntas, nenhuma resposta, você mesma que conviveu com ela esse tempo todo conhece ela melhor que eu... sim, eu sei da amizade desde meninas entre vocês, mas eu também tenho o direito de saber a verdade, não acha?... Veja a minha situação: meu pai que era meu único porto seguro se foi há muito tempo; meus avós, coitados, sempre atenciosos, não tenho do que reclamar, meu amor foi outro muito bom comigo, vovó foi à toda prova, não tenho do que reclamar, você acha que procurar saber porque a mãe odeia uma filha não é uma razão suficiente para que ela tenha sofrimentos que precisam ser questionados para que compreenda porque em toda a sua vida foi tratada com desprezo?... Tá bom, eu sei que este não é o momento certo, precisamos mesmo torcer pelas melhoras dela, mas você mesma me disse que a situação dela é grave e que os médicos disseram tratar-se de um quadro irreversível... tenho medo de nunca mais poder ver minha mãe e esclarecer tudo... Tá certo, eu espero... ficarei aqui, mesmo sob protestos, mesmo revoltada com tudo isso, estarei aqui, me deixa a par, por favor... tá bom...

 

SOBE O BG. ELA DESLIGA O APARELHO E O COLOCA SOBRE A MESA. ESTÁ PENSATIVA. ENCHE O COPO DE BEBIDA, APAGA O CIGARRO, ACENDE OUTRO. BAFORA, LEVANTA-SE, AJEITANDO AS BITUCAS NO CINZEIRO. FALA SOZINHA. SAI, JOGA AS CINZAS DO CINZEIRO NA LIXEIRA, VOLTA PRA MESA, SENTA-SE.

 

GILVANÍCILA

 

Meu pai é a melhor lembrança da minha vida. Ele sempre realizou todos os meus sonhos, sorridente, não lembro nunca de ver meu pai triste, mesmo no velório ele morreu com um sorriso nos lábios. Com todo mundo era sorridente, acolhedor, até com traste do meu... Peraí... Basta eu me lembrar daquele tio, chega me dá uma coisa ruim... eu gostava tanto dele, mas o que ele fez foi imperdoável... sofri muitos anos por causa dele, ainda hoje sofro quando me lembro... foram preciso décadas de pesadelos... por que eu me lembrei desse traste agora? Não quero me lembrar, já tinha esquecido aquela ruindade... ah, não... (LEVANTA-SE INQUIETA, VAI DE UM LADO A OUTRO)... Eu era tão jovem, ele não podia ter feito aquilo comigo, é passado, já foi. Por causa dele, meu pai morreu de infarto. Dois crimes que ele cometeu e desgraçou tudo: o que me fez na minha inocência adolescente, razão pela qual meu pai foi tragado por fulminante morte. Desgraçado!... Não posso perdoá-lo... o que ele me fez não fui curada, mas o ato dele matou meu pai e isso é imperdoável... como eu queria agora me vingar dele, vê-lo face a face para cuspir-lhe a cara e dizer tudo que tenho de raiva guardada contra ele... Parece mais que o ódio da minha mãe tem a ver com a raiva que tenho daquele desgraçado... por que ela nunca me apoiou contra ele? Aliás, ela nunca me apoiou em nada, não seria por isso que passaria a me apoiar. O único ato de apoio dela foi enxotá-lo lá de casa depois da morte do meu pai. Afora isso, não lembro de nenhum sorriso, nenhum afeto, nada dela para minha banda, sempre olhares de soslaio, muxoxos de desprezo, só queria me ver pelas costas... ah, não... (PEGA O COPO, BEBE MAIS UM POUCO, APAGA O CIGARRO, ACENDE OUTRO, BAFORA E PENSA CONSIGO, FALANDO SOZINHA). Peraí, aquela pasta com a papelada de papai que ela me deu... onde está? Preciso acha-la agora... (SAI REMEXENDO E PROCURANDO PELA CASA). Onde eu guardei, meu Deus, preciso dela agorinha, pode ter que tenha alguma pista... Não está... Onde guardei?... Ah, tá aqui... (PEGA A PASTA EMPOEIRADA E COLOCA SOBRE A MESA, ABRE-A E PASSA A PAPELADA). Ah, os cadernos com a caligrafia do meu pai e seus poeminhas para mim... só dei atenção a isso, preciso ver o resto da papelada (PASSANDO DOCUMENTO A DOCUMENTO, UMA FOLHA CAI AO CHÃO). O que é isso?... Documento de exame médico de meu pai... como é? Não pode ser... Meu pai era estéril? E de quem eu sou filha afinal... não pode ser... Se ele não era o meu pai biológico, quem seria?... Não pode ser, ah, meu Deus, diga que não, por favor... (PEGA O TELEFONE, LIGA). Atende, desgraçada! (DIGITA NOVAMENTE). Atende, por favor, atende! (DEIXA O TELEFONE PARA LÁ E REMEXE NA PAPELADA). Minha certidão de nascimento... a certidão de casamento dos meus pais... a certidão de óbito do meu pai... (REPASSA TODOS OS DOCUMENTOS E PAPELADA). Não pode ser, tomara que eu esteja enganada... (PEGA O TELEFONE NOVAMENTE, DISCA E NÃO ATENDE). Droga! Por que ela não me atende?... Ela sabe, sabe de tudo... Precisa me esclarecer... (O TELEFONE TOCA). Graças! Ôi, mulher, liguei que só pra você e não atendeu... sim, como ela está? Diz isso não... Ainda bem, mas continuam dizendo que é irreversível?... Meu Deus, o que será de mim... Tá, estou calma, me controlando, aqui esperando as suas notícias. Tomara ela saia dessa, preciso que ela saia dessa, tenho muito que conversar com ela... Descobri umas coisas agora, ah, não, não desligue, peraí, quero perguntar uma coisa... peraí, deixa eu perguntar uma coisa: descobri agora que meu pai era estéril, então você sabe quem é o meu pai de verdade? Não desligue... Eu sei que não é hora para essas coisas, mas eu tenho o direito de saber!... Então, me diga só uma coisa, só uma coisinha: eu não sou filha do traste do meu tio, né?... Por que você não pode responder, é só dizer sim ou não... Pelo menos para me apaziguar... Faz isso comigo, não. Responde vai... Eu fico aqui esperando as noticias da minha mãe, não saio daqui, mas me responde: eu não sou filha daquele que me estuprou não, né?

 

SOBE O BG. GILVANÍCILA JOGA O TELEFONE, PÕE A CABEÇA SOBRE AS MÃOS, O MUNDO GIRA. BLACKOUT.

 

CENA 4

 

BG MATINAL. JÁ É DIA NA JANELA DO QUARTO. GILVANÍCILA DORME ENROLADA NO COBERTOR, CAMA DESARRUMADA COM LIVROS, ANOTAÇÕES, UTENSÍLIOS. ELA SE ACORDA ASSUSTADA COM O TOQUE DO CELULAR.

 

GILVANÍCILA (ATENDENDO TELEFONE ASSUSTADA)

 

Sim, como ela está? (LEVANTA-SE E SE DIRIGE PARA A SALA. A MESA DESARRUMADA, PAPÉIS, O LITRO DO UÍSQUE DEITADO VAZIO, O CINZEIRO ESBORRANDO DE BITUCAS. SENTA-SE À MESA CHOROSA, CABEÇA APOIADA NA MÃO ENQUANTO OUVE A FALA NO APARELHO, DESOLADA). Sim... sim... vá direto ao assunto, como ela está depois de passar essa noite toda... os médicos disseram o quê?... sim, não enrole, os médicos disseram o quê?... sim... e tem jeito?... Como ela está agora?... Aonde?... Faz isso comigo não... (CHORANDO). Coitado dos meus avós, agora tenho que cuidar dos vivos... Eles estão muito velhinhos, tenho que dar a notícia a eles, não sei como vai ser... Tá bom... acordei agora, vou tomar um banho... posso ir praí agora?... Eu tinha muito que conversar com ela, mas agora é tarde... pelo menos poderei estar perto dela no velório, pelo menos isso... Eu já sei de tudo, não quero mais saber de culpados nem de inocentes, nem vítimas, nem carrascos... quero viver a minha vida e cuidar dos meus avós que logo logo chegará a hora deles... preciso desfrutar do que ainda me resta da minha família... Obrigado, chego já por aí. Tchausis.

 

SOBE O BG. GILVANÍCILA DEITA A CABEÇA SOBRE A MESA, AO DESALENTO.

CREDITOS FINAIS.

FIM.

 

Veja mais Sombras de Gilvanícila & As Filhas da Dor aqui, aqui e aqui.

 



domingo, abril 25, 2021

WALBER BARRETO, ENTREVISTA & O TEATRO DE PALMARES

 

 

O TEATRO EM PALMARES – O teatro em Palmares vem de longa data. O primeiro que se tem notícia lá de antanho, foi o do poeta e dramaturgo Miguel Jasseli, que foi o professor e quem incentivou os primeiros passos de Hermilo Borba Filho. Depois, por décadas, vieram as tragédias de Fenelon Barreto e as comédias de Lelé Correa. Depois destes houve um hiato e só na segunda metade dos anos 1970 é que a atividade é retomada na cidade. O recomeço se deu com o propósito de reencenar as peças de Fenelon que malograram depois de ensaios e muitos da peça Adoração, que chegou a ficar com quase tudo pronto, não fosse a intervenção familiar por questões financeiras obstando o projeto. Resolvi então encenar o meu próprio texto O prêmio – Em busca de um lugar ao sol sob a especulação imobiliária -, com uma turma nova sob a direção de Eduardo Germano – sobrinho do legendário Claudionor Germano e que estava passando uma temporada com a gente. A peça foi encenada na quadra do Colégio Diocesano e o resultado foi um sucesso. Parti para o meu segundo texto, A viagem noturna do Sol, que foi encenada em Recife, pelo TTTrês Produções, com direção de José Manoel Sobrinho. Ao retornar à terrinha para adaptar, dirigir, musicar e encenar João Sem Terra, de Hermilo Borba Filho, encontrei muita gente disposta para o elenco. Não deu outra, além de re-inaugurar o palco do Teatro Cinema Apolo, então sede da Fundação de Hermilo, de uma leva só criamos a AssociaçãoTeatral Palmarense (ATEP), pois cadastramos as atividades de 21 grupos teatrais em Palmares, fato que me levou a assumir a direção regional da Feteape, organizando a classe com oficinas e intercâmbios. Aí vieram encenações conjuntas de Contrastes Natalinos, depois O astro vermelho, de Ângelo Meyer e Pei, bufe, etc e coisa e tal, de Luiz Berto. Já era anos 1990 e me esgueirei pelo Brasil afora, tocando minhas atividades e outros projetos teatrais. Passaram-se os anos e retornei à cidade com o objetivo de encenar meu espetáculo infantil Nitolino no reino encantado de todas as coisas, o que não foi possível, pois não encontrei eco para tal realização, deixando-o para outras localidades. Mas o bom mesmo, foi tomar notícias de que a atividade estava sendo retomada por ali. E o melhor: por alguém que conhecia desde o bucho da mãe, vez que o pai dele, o Vavá de Aprígio é um parceiro de infância e de atividades musicais. Quantas vezes fui ao pai dele e o via menino, agarrado na saia da mãe, muitas. Taí, o menino cresceu e tornou-se o ator e professor Walber Barreto que, de antemão, já recebe meus aplausos de pé pela trajetória. Para saber dele, confira a entrevista abaixo.

 

ENTREVISTA: WALBER BARRETO

 


LAM - Walber, como e quando se deu seu encontro com o Teatro?

 

Meu encontro com o teatro se deu no período de escola e grupo jovem da igreja, onde na ocasião participava das apresentações tanto dos trabalhos escolares, festas comemorativas e eventos religiosos, vem a lembrança agora deste último citado com o surgimento do teatro lá no Egito e Grécia Antiga, que foi justamente com os ritos religiosos, assim aconteceu comigo.

 

LAM - Quais as influências da infância e adolescência levaram você para a definição profissional pela arte?

 

Eu não tive alguém na minha infância e adolescência que viesse me influenciar, posso dizer que o tudo que contribuiu foi justamente as apresentações na escola e igreja como falei anteriormente, também tive uma infância de verdade onde se juntava a meninada da rua e os primos para brincar de vários coisas naquela época que não existia internet, graças a Deus, creio que tudo isso foi despertando em mim o gosto pela representação, como também personagens de programas infantis na TV, que muitas vezes me pegava dizendo a mim mesmo que iria ser ator para trabalhar na TV.

 


LAM - Você começou sua carreira no Projeto Arteatro. Fala pra gente como foi essa experiência.

 

Foi aí que tudo começou para valer, em 1996, eu era estudante do Ginásio Municipal, em Palmares, e um grupo de atores da cidade, hoje meus amigos, criaram o Projeto Arteatro que era um curso de Iniciação ao Teatro, ofertado às escolas da rede pública, participei do curso ministrado pela atriz Tereza de Lima, no término nos apresentamos no Cine Teatro Apolo com o espetáculo O Santo e Porca, de Ariano Suassuna, eu na personagem Euricão, com todo esse processo do Arteatro despertou em mim a vocação para às artes cênicas que dei continuidade na minha vida.

 

LAM - Fala como se deu a experiência das performances com personagens da cultura popular.

 

Experiência maravilhosa, a cultura popular é belíssima com seus folguedos, muitas vezes atuei em eventos fazendo animação tanto com a personagem Mateus, como também Catirina, figuras do Bumba Meu Boi, são momentos prazerosos e enriquecedores, pois são performances em cima da improvisação, sabemos apenas das existências das personagens e nada mais, tudo é criado na hora com a plateia, sem ensaio, sem decorar texto, isso é um momento fantástico onde esses folguedos nos proporcionam.

 


LAM - Você já atuou com textos relevantes do teatro. Como foi entrar em cena e a recepção do público?

 

Sim, textos como O Santo e a Porca, de Ariano Suassuna, Quem é Rico Morre Inchado, de Hermilo Borba Filho, O Discurso da Pura Razão, de Elmar Castelo Branco, entre outros textos de peso da dramaturgia. É sempre uma responsabilidade dar vida a essas personagens, o friozinho na barriga realmente dar em todo ator na hora de entrar cena, mas após alguns minutos esqueço quem sou e quem passa a viver naquele momento é a personagem, só dou conta de mim quando a cortina fecha e volto ao palco para agradecer. Costumo dizer que somos médiuns e incorporamos as personagem por algumas horas. Como é gratificante a reação do público durante e depois da encenação, em presenciar a emoção da plateia, tanto com gargalhada, choro, indignação, aplausos, o importante é saber que o recado foi dado, doa a quem doer, que o objetivo foi alcançado, até chegar ao ponto de pessoas se levantarem e ir embora no meio da peça, porque a personagem tocou em suas feridas e acham que vão ser desmascaradas. Estou em um espetáculo que acontece isto, e o diretor diz que é maravilhoso quando isso acontece, pois mostra realmente que a encenação mexeu com esta pessoa.

 

LAM - Você é professor de teatro. Fala dessa sua atividade e da proposta do projeto Mais Educação.

 

No momento não estou como professor de teatro, exerci esta função por seis anos no Projeto Mais Educação, um projeto federal destinado às escolas públicas que visa deixar a criança em tempo integral na escola, onde no contra turno da grade curricular, essas crianças tenham aulas de reforços e oficinas culturais. A educação precisa de projetos iguais a estes, pois eu sou um resultado de um projeto assim lá na minha adolescência, como já falei aqui anteriormente do Arteatro. Assim como eu despertei a minha vocação e hoje sou um ator profissional, muitas crianças podem despertar também e posso dizer a você que muitos davam um show nas nossas encenações, eu costumava dizer aos meus estudantes que o teatro na escola não era apenas para descobrir talentos, mas para ajudar na formação de todos, pois os exercícios teatrais proporcionam desenvolvimentos cognitivos, relaxamento, expressões corporais e voz que servirão para todas as profissões, como na vida pessoal.

 


LAM - Conta pra gente como se deu a realização exitosa do Discurso da Pura Razão.

 

Nossa!!! Foi um processo de muito tempo, uns 16 anos atrás. Meu amigo, diretor, produtor e ator Gilvan Mota fez o convite para mim, eu na atuação e ele na direção, o texto é um monólogo, escrito por Elmar Castelo Branco, que trata das opressões e discriminações sociais e religiosas que levam a personagem à loucura, fato vivenciado pelo próprio autor. Pois bem, começamos sem compromisso nos finais de semanas tomando uma cervejinha e fazendo a leitura do texto, passamos a ensaiar, mas devido a um problema de saúde que tive paramos e passamos alguns anos com o projeto engavetado. Com o passar do tempo voltamos com o processo da montagem, eu e ele, estudando, pesquisando, ensaiando, fazendo laboratório, enfim fizemos uma estreia como um ensaio geral, percebemos que ainda precisava de reajustes, lá vamos voltar ao estudo, Gilvan tem a ideia de colocar duas personagens em cena para auxiliar a minha, assumindo a função de contrarregras em cena, casou perfeitamente e fizemos uma reestreia. Fazer O Discurso da Pura Razão é uma realização em todos os aspectos para mim, em poder vivenciar várias personagens em uma só, "o louco", ou quem sabe, o "são", porque o texto leva a esta reflexão de quem é realmente louco, até onde nós somos "sãos" e os doentes mentais, "loucos", uma verdadeira loucura, né? E foi todo esse universo da loucura que o espetáculo conquistou três prémios no FESTERÁGUAS – 2019, em São Benedito do Sul-PE, nas categorias Melhor Ator, Melhor Diretor e Melhor Espetáculo. O prêmio é maravilhoso, mas o mais gratificante foi ouvir do amigo do autor(já falecido) que viu Elmar em cena através de mim, é também quando uma pessoa da plateia depois do espetáculo vem perguntar a mim se aquilo que a personagem disse foi com ela. É uma honra para mim fazer O Discurso da Pura Razão, sinto-me realizado. Obrigado ao meu amigo Gilvan Mota pelo presente que me deu e obrigado às minhas amigas Tereza de Lima e Paula Mendes por contracenarem comigo e enriqueceram o nosso espetáculo com tanto talento de vocês. ASSISTAM!!!

 

LAM - Em tempos de pandemia, quais as perspectivas para o ator?

 

De dias melhores, não estar sendo fácil para quem depende da arte para sobreviver, se em dias "normais" a dificuldade é imensa, imagine com essa pandemia, com toda essa restrição de convivência social, vamos ser otimistas e ter fé que tudo isto passe logo para podermos voltar às produções e seguir nossa vida profissional.

 


LAM - Você foi vencedor da 6ª Olimpíada de Língua Portuguesa e atua na área. Conta pra gente como se desenvolve essa atividade.

 

Sou professor de Língua Portuguesa, no momento me encontro desempregado, mas de 2018 a 2020 fui professor da rede municipal de Caruaru-PE, em 2019 aconteceu a 6ª edição da Olimpíada de Língua Portuguesa, concurso nacional que acontece a cada dois anos destinado às escolas públicas do todo país, na ocasião era professor da ETI Álvaro Lins. A Olimpíada é realizada com as produções de alguns gêneros textuais selecionados por anos escolares, minhas turmas concorreram com o gênero crônica, começamos pela a escolha do melhor texto da turma, depois da escola e assim passando pelas etapas municipal, estadual, regional e nacional, o estudante Jairo Bezerra venceu todas estas etapas com sua crônica "Escola Fábrica, Fábrica Escola", participamos dos eventos da semifinal e final em São Paulo, conquistando as medalhas de bronze, prata e ouro. Foi um momento inesquecível e muito gratificante em competir com milhares de estudantes e professores de todo o país e ser vencedor. Vivenciamos momentos mágicos e a cerimônia de premiação na Sala São Paulo foi emocionante, logo na abertura para nossa surpresa entra o cantor Lenine cantando Leão do Norte, nossa, para nós que estávamos representando Caruaru, Pernambuco e escutar essa música exaltando o nossa Estado, foi eufórico demais e para coroar esta felicidade, vem a conquista do ouro. Só tenho a agradecer a todos os envolvidos neste belíssimo projeto que valoriza o ensino da nossa Língua Portuguesa em nosso Brasil.

 

LAM - Quais os projetos você tem por perspectiva de realizar?

 

No momento não tenho nada programado, "deixa a vida me levar", sou apaixonado pela arte teatral e com isto minhas perspectivas são de poder conquistar a cada dia novos horizontes, ultrapassar fronteiras e tornar meu trabalho cada vez mais reconhecido.

 


WALBER BARRETO –O ator e professor Walber Barreto Pinheiro nasceu em 25 de março de 1980, é filho do músico Vavá de Aprígio e da empresária Dêdêu Barreto. Estudou no Grupo Escolar Municipal Poeta Milton Souto, Ginásio Municipal e FAMASUL - Palmares. Iniciou a carreira de ator no Projeto Arteatro, em 1996, atuando em peças teatrais e realizando performances de Teatro Popular, participando de projetos como Mais Educação. Atuou no monólogo O discurso da pura razão, do premiado dramaturgo, pintor e advogado Elmar Castelo Branco , falecido em 2017, pelo qual foi premiado como melhor ator no Festeráguas 2019, em São Benedito do Sul. Como professor de Língua Portuguesa, foi vencedor da 6ª edição da Olimpíada de Língua Portuguesa, 2019, com o estudante Jairo Barbosa, na Rede Municipal de Caruaru. Veja mais Teatro aqui, aqui e aqui.

 


sábado, abril 10, 2021

REENCONTRO MARCADO


ROTEIRO CURTA-METRAGEM FICÇÃO & MÚSICA:

LUIZ ALBERTO MACHADO

 

ELENCO:

ATRIZ 1 – CATXERÊ

ATRIZ 2 – DAUMÍLIA

ATRIZ 3 – MERCA

ATRIZ 4 – ALCIONÉLIA

ATOR (AUQUÊ - Criança, ANTEU - adulto)

FIGURANTE: O SENHOR DA LUA

 

ABERTURA – TEMA MUSICAL

 

CENA 1

 

LEGENDA:

UM PASSO E OUTRO, PERPETUM MOBILE.

 

(É NOITE NA JANELA, QUARTO ESCURO. A CÂMARA FAZ UM MOVIMENTO PENDULAR LENTO DA DIREITA PARA A ESQUERDA E VOLTA: O ATOR ESTÁ ENCOSTADO NO LADO DIREITO DA JANELA. A CÂMARA PASSA ATÉ A PAREDE ESCURA E RETORNA EM DIREÇÃO OPOSTA, FLAGRANDO O ATOR QUE CONTEMPLA A PAISAGEM. OUVE-SE PASSOS E BARULHOS, RUÍDOS EXTERNOS: CHOROS, MOTORES, ESTALIDOS, SIRENES, FRENAGEM, BUSINA. O ATOR COMEÇA A ANDAR DE UM LADO PARA O OUTRO.

 

NARRAÇÃO (ATOR - EM OFF):

Estou só, extremabsolutamente só e não é a primeira vez... É noite e etcétera... Rodamundo paisagens na escurimaginação... segundesabada, sextatônita, terçou dominguante, quantanta, sabadormente, quinterminada... Não há horexata, moto continuo... ontagoras... ouroboros, negrumafora. Algo respira nas cercanias...

 

(O ATOR ENCOSTA-SE NA PAREDE DA ESQUERDA. OLHA PARA UM LADO E OUTRO. UMA SOMBRA DUPLA SOBRE A JANELA, DUAS VOZES – UMA MASCULINA GRAVE, UMA FEMININA – ECOAM):

 

VOZES ECOAM (EM OFF)

Finis ab origine pendet... (BIS, ECO)

 

(A CÂMARA SEGUE DE UM LADO AO OUTRO ENQUANTO AS VOZES ECOAM E PARA NA PAREDE DA DIREITA: UMA MULHER NUA, EM CLOSE, OMBRO DIREITO ENCOSTADO NA PAREDE, AS MÃOS CRUZADAS SOBRE O VENTRE, PERNA DIREITA CRUZADA SOBRE A ESQUERDA NA PONTA DO PÉ. CLOSE NO ATOR: ESTÁ ESPANTADO!)

 

NARRAÇÃO (EM OFF - ATOR)

Quem é você? (ECO)

 

ATRIZ (EM OFF)

Não sabe? Lembrará...

 

(A ATRIZ APONTA PARA MESA ONDE UM LIVRO ENORME E GROSSO SE SOBRESSAI ENTRE LÁPIS, CANETAS, BORRACHAS, LUPA, CADERNOS, LIVROS, UM MAPA MÚNDI E UMA GRAVURA DE UMA SERPENTE – OUROBOROS. ELA ABRE OS BRAÇOS EM FORMA DE CRUZ – CORES, LUZES, SONS, IMAGENS, SOMBRAS DURANTE O MOVIMENTO DELA. BRAÇOS ABERTOS, TOMA UMA INSPIRAÇÃO PROFUNDA, EMITE UM SOM VOCAL E OS BRAÇOS RETOS SOBRE A CABEÇA – MOVIMENTO COM A IDEIA DE TRIÂNGULO. LENTAMENTE ELA REABRE OS BRAÇOS EM CRUZ, RESPIRA PROFUNDAMENTE, EMITE UM SOM VOCAL E FAZ UM MOVIMENTO OPOSTO, BRAÇOS ESTICADOS DESCENDO ATÉ AS MÃOS SE ENCONTRAREM SOBRE O VENTRE. ELA APONTA PARA O LIVRO SOBRE A MESA. O ATOR APROXIMA-SE E POUSA A MÃO SOBRE A GRAVURA E LENTAMENTE ABRE O LIVRO E FOLHEIA. LUZES, CORES E SOMBRAS. BLACKOUT. SOBE BG).

 

CENA 2

 

TEMA MUSICAL

 

LEGENDA

UBÍQUA LUA.

 

(É NOITE. A LUA NA JANELA E UMA MULHER CHEGA, ENCOSTA-SE DO LADO ESQUERDO E CONTEMPLA).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 2 (DAUMÍLIA CONTEMPLA A LUA NA JANELA):

Nasci num dia de sábado e era festa. Era ainda menina quando conheci o Senhor da Lua e a minha infância era só dia porque ele me deu o côco do cajubi. Na adolescência ele deu-me o côco do tucumã para que eu soubesse da noite e conhecesse o outro lado dela, o demônio tembé Azã, e eu soubesse que a vida não só era uma pitada de açúcar com pinceladas das melhores cores. Foi quando me descobri Selene a exorcizar erradia o destino, o passado e o presente por noites e dias... (BLACKOUT)

 

CENA 3 – TEMA MUSICAL

 

LEGENDA:

A LUZ: IGNIS CENTRUM TERRAE

 

(É NOITE. UMA MULHER ENCOSTADA DO LADO DIREITO DA JANELA, CONTEMPLA O FOGO NOS CASTIÇAIS À SUA ESQUERDA)

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 3 (MERCA):

Sou branquela, sim sou, mas há uma cigana fogosa e muito doida, pomba-gira, dentro de mim. Ah, se tem! Rodo a saia, coxa nua. Bato castanholas aos rodopios, sonho de pai. Até que levava jeito para bailar, não fossem as dores na ponta do pé. Tanto fez meu pai, herói da minha vida, nem me viu crescer direito e me tornar essa que sou: um desmaio abissal. Desastres e tropeços. No meu corpo e alma o fogo de Minarã, isso sou: inflada e perspícua. Basta ter um coração e já estou fascinada; senão, cinzas esvoaçantes na minha fome maldita de amar além da conta. E brinco com o vinho branco e seco para ir além do que posso, sempre, a louca de pedra, devastadora, regida pelo Sol porque sou girassol e efusiva labareda, que se dane o mundo, consegui liberdade e isso sou. (BLACKOUT)

 

CENA 4 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

O DIÁRIO DO MAR AINDA NÃO NAVEGADO.

 

(NOITE NA JANELA. OUVE-SE UMA TORNEIRA PINGANDO, O BARULHO DE UMA DESCARGA HIDRÁULICA. CHOVE. UMA MULHER APARECE, VAI ATÉ A JANELA, ESPIA DOS LADOS E SENTA-SE À MESA, À ESQUERDA RABISCANDO NUM CADERNO SOB UM ABAJUR).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 4 (ALCIONÉLIA):

Nasci do mar, sou sal da Terra, vou e volto, simples à flor d’água. Tenho minhas profundidades inalcançáveis: sou todas e muito mais, sonhadora de olhos abertos, apaixonada pelo impossível. Pareço calmaria, não sei o que é o amor, nunca vi, apenas vivo e não sei como. Tudo é muito do outro lado, porque lá não estou. Minha vida é esperar e o meu diário, perdi minhas raízes. Não existo para quem é incapaz de ouvir o silêncio. Estou sozinha e a noite é enorme em minhas vestes, pele e juízo. Do mar sou assim e inteira... (BLACKOUT).

 

CENA 5 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

EQUÍVOCO E FARSA.

 

(É NOITE NA JANELA. OUVE-SE PASSOS, PASSADAS, CARRERIAS, MOTORES, PIADOS NOTURNOS, PORTA QUE SE ABRE LÁ FORA E SE FECHA, OUVE-SE O MOVIMENTO DE PERSIANAS. UMA SIRENE. UMA MOTO QUE PASSA LÁ FORA. CÂMARA NO VENTILADOR À DIREITA. O ATOR APARECE DA DIREITA, OLHA A RUA PELA JANELA, VOLTA-SE E SENTA-SE À MESA À ESQUERDA, VERIFICA O PAPEL COM UMA GRAVURA, FOLHEIA O LIVRO E TENTA LER, ENQUANTO BEBE, PASSA O DEDO NAS BORDAS DO COPO, COMPLETA O COPO, FUMA E PENSA COM A FUMAÇA).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATOR:

Finis ab origine pendet. Ouroboros. (SUSSURRA, REPETE. MÃOS AO QUEIXO, PENSANDO). Entendi tudo errado! Tudo errado até agora! Sou uma inútil farsa! Confundi tudo, mal-entendidos demais. Não posso apenas viver entre prós e contras, é muito pouco. Nem tudo é lá e loa, quantas já desabei, quem amigo possível... eu e ninguém: o calafrio da queda e do isolamento. A oclocracia é uma piada! As idas e vindas, o que era e não, o que foi e voltou, a vida e a morte. Juntar os cacos, a sorte do inseto. Um abismo escancarado e pronto para me devorar inteiro. Só a poesia tornará a vida suportável. (BLACKOUT).

 

CENA 6 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

A LUZ NO FIM DO TÚNEL.

 

(A LUA NA JANELA. A ATRIZ À DIREITA OUVE O ANCIÂO À DIREITA. GESTICULAM COMO SE CONVERSASSEM, MÍMICA).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 2: DAUMÍLIA:

Casei, engravidei, me divorciei e isolei o amor. Nunca acreditei no amor, lição dos meus pais imigrantes. A vida de casada foi dolorosa, nada além da frieza racional: a insossa vida esponsal. Não fosse a minha filha e o Senhor da Lua não saberia sobreviver. A vida prega das suas. E de uma hora para outra, cá estou descabelada, vulnerável. Entrei em colapso com um olhar apenas... e o feitiço do amor. Pronto, ressuscitava Selene e nem mais me reconheço. O amor roubou minha razão e sanidade... (BLACKOUT).

 

CENA 7 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DA EXPECTATIVA AOS ALVOROÇOS IMPREVISÍVEIS...

 

(UMA MULHER À ESQUERDA DA JANELA, SEGURA UMA TAÇA DE VINHO BRANCO, OLHA LÁ FORA E VOLTA A CONTEMPLAR O FOGO NOS CASTIÇAIS À SUA DIREITA. ENTRAM E SAEM PESSOAS NO RECINTO, OUVE-SE CORRERIA, BATE-BOCA, PORTAS SE ABREM E FECHAM LÁ FORA. OUVE-SE CONVERSAS).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 3 – MERCA:

Naquele dia estávamos todos em polvorosa, era a chegada dele. Fui a primeira a vê-lo, arrumei-me toda. Fitou-me os olhos e me empolguei com o cumprimento afetuoso. Um arrepio adoravelmente aprazível. A distância do marido, a filha com os avós, a solidão e aquele chefe, um sufoco. O mês passou rápido e eu toda noite ardendo em brasa, contando as horas para vê-lo, planos e os sonhos do pai reanimando a alma. Agora era pra valer: o homem estava ali, todos os dias, para enfeitiçá-lo. (BLACKOUT).

 

CENA 8 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DAS NAVEGAÇÕES POR TORMENTAS QUASE SEM BONANÇAS...

 

(À JANELA, CHUVA TORRENCIAL. A MULHER VAI E VOLTA DE UM LADO A OUTRO, PARA À JANELA, CADERNO À MÃO, FOLHEIA, CORRIGE, APAGA, SOB A LUZ DO ABAJUR).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 4 – ALCIONÉLIA:

A solidão é o meu naufrágio. Sou veio nas horas prementes, espremida e quase morta na minha evasão. Sou brejo nos dias nublados, é quando ouso renascer. Sou riacho quando me sinto presa e penso sair sem para onde ir... até ser enchente calamitosa e me explodir num maremoto extravasando oceanos. Meus tormentos são cachoeiras que me fazem fugir de mim mesma... sou quase viúva sem futuro, aqui sozinha, com meu diário e sonhos exclusivos. A chuva é meu choro e nela vou me afogar. (BLACKOUT).

 

CENA 9 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DE ENTRADAS, SAÍDAS, CHEGADAS E ESCAPADAS.

 

(É NOITE. O ATOR VAI ATÉ A JANELA E OBSERVA O MOVIMENTO. BARULHOS DE AUTOMOVEIS QUE PASSAM, SEMÁFOROS, TRANSEUNTES, PASSADAS. ERGUE O OLHAR NO HORIZONTE).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATOR:

Ao chegar à cidade estava tão deslumbrado quanto perdido com o cheiro gostoso de sargaço no ar... um bicho solto pela selva de prédios e gente e sombras e luminosos e esconderijos e transversais múltiplas no coração. Primeiro, a vizinha Alcionélia e sua aliciante boniteza com as boas-vindas, coisa de enlouquecer e eu nas nuvens redimindo tantos desesperos e premências. Novo trabalho, novo momento para uma vida nova, preciso me concentrar melhor... (BLACKOUT).

 

CENA 10 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DAS SURPRESAS NA MANHÃ.

 

(A LUA NA JANELA, A MULHER CONTEMPLA LÁ FORA, LIVROS À MÃO)

 

NARRAÇÃO (EM OFF) – ATRIZ 2 – DAUMILIA

Contava os dias para dar de cara de novo com Pã, isso mesmo: deus da luxúria e do pecado. É assim que ele é para mim, só de vê-lo até me estranho, nunca fui assim. É a vida e cada um que se livre dos seus passos em falso. Fui liquidada e é a primeira vez. De repente esqueci propósitos, perdi o raciocínio, destravei e nunca me vi tão pornográfica, talvez porque nunca tenha amado e agora enredada pelo amante indômito. Como eu queria estar com ele, invadiu meu coração, destrancada e desprovida de qualquer defesa. Estou me desconhecendo... (BLACKOUT).

 

CENA 11 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DO MORMAÇO DA TARDE.

 

(ENTARDECER. A MULHER À DIREITA DA JANELA COM UMA TAÇA DE VINHO À MÃO, BEBE E CONTEMPLA A CHAMA DOS CASTIÇAIS. ELA ESTÁ SEMINUA E MOLHADA DE SUOR, SENSUALMENTE SE ABANANDO. OUVE-SE O BARULHO DA CIDADE).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) – ATRIZ 3 – MERCA:

Sou pau para toda obra, uma diaba! Não sou de brincadeira, edifico o que for para ser levada a sério, ou descarto de não sobrar vestígios do monturo. Apesar de tudo isso, uma coisa é certa: a solidão dói e sigo em frente. Cadê a Lua? Eu me pego falando sozinha no meio dessa encruzilhada de vida. Não sei mais o que faço para me apaziguar. Não sou infiel, apenas uma bailarina frustrada. Eu mereço! Saudades da minha filha. Meu coração balançado, ah, meu Deus, o que estou fazendo? Eu não sei, sou uma meleca, o que será de mim? O espelho não mente: estou envelhecendo e me gastando sozinha. Tenho que dar um jeito, já endoideci com a solidão. Vou pro meu ritual, me aguarde. (BLACKOUT).

 

CENA 12 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DO INESPERADO NOTURNO.

 

(MULHER À JANELA CONTEMPLA A TEMPESTADE NOTURNA).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 4 – ALCIONÉLIA:

Não sei o que será de mim, mais um dia, menos dia, estou reduzida às traças. Quanto abandono, isso é ruim demais, impossível sobreviver. Estremeço só de pensar, desacompanhada, não tenho mais sanidade mental, desilusão intolerável, temores injustificáveis. Nenhuma motivação ao amanhecer, nada muda de tarde e piora à noite, tudo igualmente ontem, anteontem. Todo dia me reinvento, tento, estagnação cruel, não sei mais o que fazer nessa claustrofobia irrespirável. Não tenho cura nem salvação. Ficar aqui me matando, remoendo, oh não, a infância, o estupro, a adolescência, pesadelos que me perseguem, não, preciso fazer alguma coisa e já! Vou à luta! (SAI. BLACKOUT).

 

CENA 13 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

DA LOUCURA DE DIAS E NOITES.

 

(A CÂMARA GIRA NA ESCURIDÃO, NOITE NA JANELA, BARULHOS DA CIDADE. O HOMEM VAI E VOLTA, ESTÁ PENSATIVO).

 

NARRAÇÃO (EM OFF) – ATOR:

Acordei no meio da noite, a vida gira, coisas acontecem. A vizinha acolhedora, nada melhor, persegue meus pensamentos: um ato falho e ela tão próxima, ao alcance da mão. A secretária solícita, ajuda bastante, uma provocação. A doutora charmosa, exuberante, linda de morrer. Preciso rever meus projetos. A vida poderia ser diferente... (SAI. BLACKOUT).

 

CENA 14 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

OS TORTUOSOS CAMINHOS DOS ENCONTROS.

 

(A LUA NA JANELA. À DIREITA, UMA MULHER JANTA SOZINHA À LUZ DO LUAR. MESA POSTA: UTENSÍLIOS DE PORCELANA, MUITO LUXO. A CÂMARA SEGUE PARA ESQUERDA, A JANELA E, À DIREITA, O ATOR ENCOSTADO NA PAREDE DÁ UM PASSO E AO CHEGAR AO CENTRO DA JANELA DÁ DE CARA COM A ATRIZ 3 – MERCA QUE VEM DA ESQUERDA. ELA SE APROXIMA GESTICULANDO COMO SE CONVERSASSE. PRIMEIRO BEIJA UMA DAS FACES DELE QUE ESTÁ IMÓVEL, ATENTO AOS MOVIMENTOS DELA, E ELA CONTINUA AMAVELMENTE GESTICULANDO COMO QUEM FALA APAIXONADAMENTE. OUTRO BEIJO ÀS FACES DELE. ELE ATENTO, SE DESPEDEM. DE REPENTE ELA O PUXA PELA MÃO E BEIJA OS LÁBIOS E SAI CORRENDO. ELE ACOMPANHA A SAÍDA DELA PELA DIREITA, SE VOLTA E VÊ-LA SAIR. SEGUE ADIANTE PARA ESQUERDA. DA DIREITA SURGE A ATRIZ 4 – ALCIONÉLIA QUE SE ENCONTRA COM O ATOR E O ENTREGA ALGO NO CENTRO DA JANELA. ELE DEMONSTRA SURPRESA, SORRI. INESPERADAMENTE ELA ENVOLVE SEUS BRAÇOS AO REDOR DO PESCOÇO DELE E O BEIJA ARDENTEMENTE. DEPOIS DO BEIJO, ELA SE SEPARA, AMBOS SE FITAM E SAEM EM SENTIDOS OPOSTOS. (BLACOUT).

 

CENA 15 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

AS MOIRAS TECEM DESTINOS.

 

(SURGEM UM CASAL DANÇANDO – É O ATOR E A ATRIZ 3 – MERCA. ELES SE BEIJAM E RODOPIAM, SAEM DE CENA. BLACKOUT).

 

CENA 16 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

O CÍRCULO SE FECHA PARA ENREDAR RECOMEÇOS.

 

(UM CASAL ESTÁ SENTADO À MESA: O ATOR E A ATRIZ 2 – DAUMÍLIA. ESTÃO COPO NA MÃO COMO SE ESTIVESSEM BEBENDO, FITAM UM AO OUTRO, BRINDAM. FALAM ENTRE SI. E SE BEIJAM. BLACKOUT).

 

CENA 17 – TEMA MUSICAL

LEGENDA:

A TRÍADE NO VÓRTICE DO TEMPO.

 

(DAUMÍLIA – ATRIZ 2 – À JANELA FITANDO A LUA. SAI. À ESQUERDA, MERCA – ATRIZ 3 – CONTEMPLA AS CHAMAS NOS CASTIÇAIS. A CÂMARA SE VOLTA PARA A DIREITA, ALCIONÉLIA – ATRIZ 4 – CONTEMPLA A CHUVA TORRENCIAL. A CÂMARA SEGUE PARA A ESQUERDA: O ATOR SURGE CRUZANDO A SALA, OLHA À JANELA E SAI PARA A DIREITA. SURGE DAUMÍLIA QUE CRUZA DA DIREITA PARA A ESQUERDA. SURGE MERCA QUE CRUZA DA ESQUERDA PARA DIRETA. SURGE ALCIONÉLIA QUE CRUZA DA ESQUERDA PARA A DIREITA E AS TRÊS SE ENTRECRUZAM, O ATOR ENTRE ELAS. EMERGE A ATRIZ 1 – CATXERÊ NO CENTRO DA JANELA ENQUANTO O ATOR E AS ATRIZES SE CRUZAM. O ATOR À DIREITA DEPARA CATXERÊ QUE SE VIRA PARA ELE ENQUANTO AS ATRIZES CIRCULAM EM TORNO DELA).

 

NARRAÇÃO (EM OFF): ATOR

Quem é você?

 

NARRAÇÃO (EM OFF) ATRIZ 1 – CATXERÊ:

Não se lembra, mas lembrará (A FRASE ECOA E ELA APONTA PARA O LIVRO SOBRE A MESA À DIREITA).

 

(DIÁLOGO EM OFF)

 

ATOR:

Quem é você?

 

CATXERÊ:

Sou Catxerê.

ATOR:

Quem?

 

CATXERÉ (RODOPIA ENQUANTO AS ATRIZES CIRCULAM AO SEU REDOR)

Sou sua tia Euaqui e a Lua (VOZ DE DAUMÍLIA CHAMANDO: Auquê! Auquê!). Sou o fogo de Nhocpôcti (ELA ENTREGA DUAS PEDRAS, DOIS GRAVETOS E, DEPOIS, UMA TOCHA ACESA. APARECE MERCA QUE SEGURA A TOCHA E SAI). Sou Mareico e as águas (APARECE ALCIONÉLIA QUE O FITA E SAI). Você sonha, Anteu. (ELA APONTA PARA A LUA E DAUMÍLIA SURGE DIANTE DELE E DIZ: Já olhou pro céu? Hoje não tem lua, só estrelas. Sou Hári, a lua, filha da Terra e estou aqui como sua tia Euaqui. (DAUMÍLIA SAI, FICA CATXERÊ E SURGE MERCA QUE FALA: Lembra de mim? Sou Candiê-cuéi, vamos fazer uma fogueira (O ATOR FICA ESPANTADO, MERCA SAI. NOVAMENTE CATXERÊ E SURGE ALCIONÉLIA QUE DIZ: Oi, Anteu, vamos? O ATOR: Quem é você? Sou Capa-cuei, não diga que não se lembra mais de mim? (ALCIONÉLIA SAI. AS ATRIZES CIRCULAM CATXERÊ E A SEGUEM).

 

CENA 18 – TEMA MUSICAL

 

LEGENDA:

DO COMEÇO, MEIO, FIM E RECOMEÇOS.

 

(A CÂMARA CLOSE EM CATXERÊ AO CENTRO. CLOSE EM DAUMÍLIA À DIREITA. CLOSE EM MERCA À ESQUERDA. CLOSE EM ALCIOONÉLIA À DIREITA. CLOSE NO ATOR QUE OLHA PARA OS LADOS COMO SE ACOMPANHASSE O MOVIMENTO DAS ATRIZES QUE SAEM E SE CRUZAM AO CENTRO. CLOSE NO ATOR: ELE SE VIRA PARA A DIREITA, SURGE CATXERÊ. OLHA PARA ESQUERDA, DAUMÍLIA. SE VOLTA PARA A DIREITA, MERCA. RETORNA PARA A ESQUERDA, ALCIONÉLIA. O ATOR AO CENTRO DE COSTAS PARA A JANELA, AS ATRIZES SE CRUZAM PASSANDO POR ELE. CATXERÊ SE PORTA AO SEU LADO, ERETA, DE PERFIL. AS DEMAIS ATRIZES CIRCULAM AMBOS. ELE AFASTA-SE. CATXERÊ VAI PARA A JANELA E DE FRENTE PARA ELE ABRE OS BRAÇOS EM CRUZ).

 

DIÁLOGO (EM OFF)

 

ATOR:

Quem é você?

 

CATXERÉ (ENQUANTO AS ATRIZES CRUZAM ENTRE ELES)

Sou a serpente Anguborda (E APONTA PARA O LIVRO SOBRE A MESA E A GRAVURA DA SERPENTE OUROBOROS)...

 

ATOR

Não sei quem você: se Euaqui, Hári, Daumília, Nhocpôcti, Candiê-cuié, Merca, Mareico, Capa-cuei, Alcionélia, Catxerê ou Anguborda...

 

CATXERÊ

Todas são você mesmo. não há o que explicar, apenas sentir e sou.

 

ATOR

Ora, quem é você afinal?

 

CATXERÊ

Sou sua mãe. (BLACKOUT).

 

FIM.

 

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